Nos dias atuais tem sido comum o uso de expressões e cobranças de atitudes que representem compromisso social, sustentabilidade, observação de preceitos e valores morais, comportamentos éticos, defesa dos direitos, respeito aos animais, entre tantos outros...
As pessoas vivem um despertar de cobrança de direitos, (como diria um ex presidente), nunca antes visto neste país, resultado das chamadas “conquistas” de grupos, etnias, corporações, etc. Estas conquistas, a meu modo de ver, seriam motivo de grande comemoração e júbilo, caso as pessoas percebessem que além dos seus direitos também existe um grande número de deveres que deveriam ser cumpridos com a mesma intensidade em que se luta por aqueles direitos.
Como exemplo dessa constante dicotomia, falamos em sustentabilidade, mas não separamos o lixo reciclável do lixo orgânico na nossa própria casa; falamos mais em respeito aos animais do que em respeito ao vizinho que não pode dormir por causa do som que resolvemos desfrutar; falamos em exemplo para as próximas gerações, mas defendemos a liberdade de corruptos e a criminalização dos atos daqueles que expuseram as feridas da corrupção e que de certo modo estancaram a sangria dos cofres públicos e ainda recuperaram dinheiro “roubado” do bolso do trabalhador.
Outro exemplo são as redes sociais, tomadas de postagens e compartilhamentos de mensagens solidárias de pessoas que encaram a depressão como uma doença e até se oferecem para ajudar e conversar, encerrando o “post” com a belíssima frase: eu quero você vivo! Outro dia resolvi fazer o teste e puxar conversa com um destes “paladinos” e a resposta não veio. Visualiza a mensagem, mas não responde. É cômico!
Mais preocupante ainda, é a quantidade de pessoas que se manifestam nas redes sociais pelo fracasso de um governo eleito de forma legítima e democrática e que enfrenta, além dos problemas estruturais, uma prole de beneficiados que não se conformam com a perda de status e benesses cortadas. Isso sem falar de grande parte da imprensa tendenciosa que também se beneficiava com a manipulação da informação. Tal comportamento, em pleno século 21, se encaixa ao que dizia Nicolau Maquiavel* (séculos 15 e 16) no prefácio da obra “O Príncipe”, quando escreveu:
“Nada é mais difícil de executar, mais duvidoso de ter êxito ou mais perigoso de manejar do que dar início a uma nova ordem de coisas. O reformador tem inimigos em todos os que lucram com a velha ordem e apenas defensores tépidos nos que lucrariam com a nova ordem.
A abordagem do conteúdo aqui apresentado não tem o intuito de “vagar” pelo campo político-partidário, mas propor a seguinte reflexão: as liberdades individuais não podem prescindir da responsabilidade a que estão atreladas.
A facilidade de dispormos de equipamentos telefônicos com câmeras, filmadoras, gravadores de áudios e vídeos, etc, além da rapidez na divulgação de informações, exigem responsabilidade redobrada naquilo que manifestamos, postamos, comentamos, ou reproduzimos nas redes sociais.
Diante de tanta facilidade em expressar opiniões, publicar denúncias, compartilhar notícias e manifestar alguma preferência em qualquer tema, é recomendável que façamos as seguintes perguntas: Existe alguma utilidade naquilo que vou postar/compartilhar? Ou ainda: o que estou divulgando é verdade? E por ultimo: devo postar, divulgar ou compartilhar tal informação? Estas são perguntas que nos ajudam a decidir sobre o valor da informação como conteúdo útil e de algum proveito para quem esta recebendo. É o mínimo que podemos fazer, antes de cairmos na “vala comum” daqueles que priorizam visibilidade acima da utilidade.
Caso contrário, ficaremos reféns ou seremos os algozes do “denuncismo” exagerado e da irresponsabilidade digital que já produziu e vem produzindo vítimas através de “Fake News”, postagens desnecessárias, informações distorcidas, revanchismo e outras formas de agir que valorizam o sensacionalismo e o jogo político, sem se preocupar com a verdade e o dever de contribuirmos para a construção de uma sociedade mais justa, responsável e solidária.
* Filósofo, político, historiador, diplomata e escritor italiano, autor da obra-prima "O Príncipe".